O dia todo procurei-te nos meus escritos, invento-te e admiro-me tanto. Minhas palavras me confortam de tal forma que eu não paro de te inventar. Agora eu já não roteiro, medidas, força. Você já não é mais aquilo que sempre foi, você sou eu. Meus sentimentos são seus. Meu caminho é longo e eu continuo escrevendo. Tenho vergonha dessas palavras jogadas. Paro, penso e reflito. Apago as luzes. No escuro relembro do vazio. Ligo o Play e vou me ensandecendo. Por ti, por mim, por nós.
Continuo sentado atrás da janela, vejo as ruas, os carros, o relógio. Fecho os olhos e me jogo à beira mar. Meus pensamentos se misturam. Aquele homem em pé com malas na mão se multiplica. Tira-me daqui. Quero ficar aí no seu quarto apertado, com todos os seus lamentos. Tive medo de te perder pra sempre. A vida é tão complicada. A gente podia sair, dar uma volta, ir pra bem longe. E fantasio e fantasio. Estou sozinho e já não te tenho mais. Tento te escrever, mas não consigo.
Eu fujo, corro, sem controle. Procuro-te em alguma direção. Não te encontro mais, já não me encontro mais. Vicio nesse jogo e agora quero parar. Não posso, meus sentidos estão despidos. Mal distinto. Sinto graça, perco a graça nessa busca incessante. Banquete seu. Vejo você me devorando e eu te admiro tanto. Permeio no vazio de mim, me sufocando nessa tua obsessão e continuo a escrever. Já não me lembro do seu rosto, tão pouco do seu sorriso. Perco a vontade de criar outras formas, possíveis formas. Não as suas, mas as minhas. Te rabisco no meu corpo, desânimo meu. Te quero aqui, te procuro aqui. Encontro um abrigo em mim. Te tenho no meu corpo todo. Você está escrito em mim.
Levanto-te com minhas palavras e revelo-te. Elas são mais fortes que meus sentimentos. Tiro a roupa. As portas entreolham-se e eu te tenho em mim.Eu grito mais ninguém me escuta. Entreaberta, entrefechada, deixo passar meia pessoa por vez. Eu me perco de ti. Disseram-me que era impossível. Mas o que seria possível agora?
Tento de novo, erro de novo. Perderam-se os acordos. Tiro as suas impurezas da minha pele e permaneço impassível, Tenho vergonha de ti misturado, apaziguado no meu corpo. Ponho a roupa do trabalho e permaneço nu. Ponho fogo nos meus escritos para você fugir de mim. Agora já não restam nada, apenas rascunhos seus.
Permaneço sentado, arraigado nesse pequeno banco. As minhas costas doem e minhas mãos se cansam e meus pensamentos se fortalecem. Sinto-me, Cheiro-me. Fico ausento de ti, de mim, de nós. Minha cabeça pesa e minha mão coça. Escrevo-me. Agora te tenho, aqui, bem perto, de novo.