Hoje, eu me procurei pela casa inteira por horas, me perdia em me achar pela casa, em todos os cantos por cada detalhe mínimo por máximo e vice-versa. Sem sucesso não me encontrei em nenhum GPS ou radar. Não estava nem debaixo nem em cima do colchão, também não me encontrei debaixo da cama, muito menos no armário e nem em nenhuma gaveta do criado mudo, não estava na pasta de arquivos no serviço e não encontrava na caixa do correio do condomínio e nem perdido entre as bolinhas de papel da cestinha embaixo da minha mesa. Me procurei nos bolsos da calça e da camisa, também não me achei na embalagem de leite em caixinha, lá não tinha minha foto como desaparecido nem meu nome como procurado no mural da delegacia. Decepcionado fiquei, em não ver nada a respeito na televisão, o rádio não ouvi nada, os jornais pior ainda, futebol, guerra do tráfico com a polícia, glamour da coluna social, e os capítulos da novela das nove, mas eu não estava lá, e ninguém citou meu nome, até nos classificados procurei, mas só conjugados, dois quartos com suíte e duas vagas na garagem, com porteiro 24 horas, meu nome e meu rosto não estava no outdoor, muito menos no vidro traseiro de nenhum ônibus.
Fui então me procurar, me procurar pelos lugares improváveis, assim, atrás de mim, me procurar onde eu não estou, digo, aonde eu possa me encontrar, eu que não estou nem aqui, nem ali, nem debaixo, como fazer? Pra aonde ir? Me procurar pelos lugares improváveis atrás de mim, pela escuridão tentar me achar, percorrer os cantos escuros aonde eu, atrás de mim, pelas minhas sombras, digo, pelas sombras me encontrar. Isso me basta, digo, isso basta, isso basta, isso basta, isso basta, isso basta, isso basta, basta talvez percorrer pelas palavras, depois da escuridão as palavras, nos cantos das páginas amarelecidas, percorrer atrás de mim, nos cantos escuros das páginas amarelecidas, assim, me procurar nas assinaturas ilegíveis nos cantos escuros das páginas amarelecidas, assim, eu posso, atrás de mim, me encontrar.
(*Escritos com César)